terça-feira, julho 11, 2006

Trazido pelo ócio

Quis escrever cartas, mas nem sei a quem.
O impulso é forte e quase instintivo: queria um leitor que me fosse antes de tudo afetuoso e paciente, que não se importasse se a carta em si é desimportante e lhe tenha ainda assim tomado tempo.
E não há o que dizer; não há sequer motivo para carta alguma.
Antes, há o direito e a necessidade de grito, e talvez o grito só exista se alguém o escutar.
E há a necessidade primal: a carta, sem para onde ou a quem e sem o quê, como boi que urra se tangido a ferro.
Para que serve seu urro se ninguém lhe socorrerá? Do mesmo modo, temos a carta, que não é uma carta de suicida. Suicidas escrevem cartas por motivos outros. Têm sorte; já usufruiram demais dos seus direitos, mas não acharam quem lhes ouvisse o urro.
Depois de tudo silenciado, não há silêncio; há urros.