sexta-feira, dezembro 01, 2006

A mais-valia do nada

Belisque-se e sinta a dor que prova que você está vivo e respira.
Corte-se, veja o sangue correr. Lamba-o, sinta o seu sabor todo protéico, gosto da vida.
Sim, você está vivo e respira.
E nada além disso: alguns aglomerados de átomos.
A vida não é injusta, mas precária. Falam da vida como se ela fosse cheia de armadilhas e estratagemas: as pessoas só têm derrames para aprender que são mortais, só tem câncer para que aprendam que não devem fumar.
Buscar um objetivo transcendente na vida é a grande mais-valia de um planeta que só é possui nome porque possui temperatura adequada e água, condições indispensáveis à formação de coacervados.
E a vida humana tem o valor de qualquer vida, com a diferença que os humanos insistem em buscar aconchego no colo dos santos e de achar que sua presença neste mundo deve-se a algo além da pura coincidência, afinidade de moléculas e descargas elétricas.
Buscar ordem nisso não é mais do que exigir algo que não se possui. Não há destino, não há proposta. Um dia, fomos apenas carbono e a ele acabamos voltando sempre, sempre.
Sem dúvidas.
Viver é muito perigoso, mas não há nada nem ninguém que se importe com isso além daqueles que correm o perigo da mais-valia que é a vida. Não se engane: a não ser pelos choques e explosões de corpos celestes, o céu é todo ermo e silencioso. Deserto.