quarta-feira, novembro 24, 2004

Trinta de duas linhas em louvor à verborragia

Estou com vontade de escrever e é só. Nenhum tema específico. Só alguma melancolia e falta de entendimento sobre algumas coisas que vêm acontecendo. Normal. Não sou bem o tipo de pessoa que entende a vida. Talvez seja assim porque nunca gosto de crer que ela é tão cruel e nem que as pessoas são tão ruins e egoístas. A impressão que dá às vezes é que todos só pensam em se satisfazer: luxúria, ganância, falta de vontade absoluta de firmar amizades verdadeiras por mera impaciência para conviver com os defeitos alheios. Dizem que ninguém é solidário, que só se tolera com paciência a dores e limitações alheias. Eu não sei. O que sei é que vivo em mundo essencialmente carente e o fato de a vontade compulsiva por relacionamento amoroso incomodar-me deve-se, sobretudo, ao fato de ser uma realidade com a qual convivo, que nos circunda e sufoca.
A mim parece que todos buscam companhia e ninguém parece achar, procuram apenas. Relações de conhecimento e partilha profundos parecem tão difíceis e tudo vai em velocidade de linha de produção, onde a análise de controle de qualidade dificilmente poderia ser menos superficial. Falta generosidade, falta altruísmo, falta compreensão, falta respeito sobretudo. O que sobra é solidão, carência, tristeza. Alguns colocam a culpa na tecnologia. Adoram dizer que elas nos deixa sozinhos no meio de multidões. Não discordo, mas tenho minhas dúvidas quanto ao fato de ela ser realmente a única culpada. Talvez seja uma conjuntura mais abrangente que nos torne individualistas doentes e carentes e que adoramos a enganação de que talvez venhamos a viver algo diferente, mais mágico e puro, livre da sordidez. Será?

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Às vezes temos que optar por mudanças. Eu optei por ficar como estou: meio sem rumo, meio perdido, meio sem muitas expectativas. Medo de mudar? Talvez. Tentativa de não sair do meu foco, das minhas metas. Quais eram as metas mesmo?

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ODEIO LACONISMO.

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Fuvest chegando. Estou ansioso apesar de saber que devo evitar a ansiedade. Sei que tenho boas chances, mas sei também que não passei e sei que há a possibilidade de não passar. Seria muito frustrante. Inútil pensar nisso agora!
Qunato mais estudo, mais tenho a impressão de que emburreço. Fico um pouco chateado com o fato de que existe muita gente muito melhor preparada do que eu. De qualquer modo, veremos no domingo como me saio.
Eu, tal qual Deus (Antônio, prof. de História hehehehe), acredito em trabalho duro... Sorte é para quem precisa dela. Desejo boa prova a todos.

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Verdade universal: Drummond é O poeta.


Aurora

O poeta ia bêbedo no bonde.
O dia nascia atrás dos quintais.
As pensões alegres dormiam tristíssimas.
As casas também iam bêbedas.

Tudo era irreparável.
Ninguém sabia que o mundo ia acabar
(apenas uma criança percebeu mas ficou calada),
que o mundo ia acabar às 7 e 45.
Últimos pensamentos! últimos telegramas!
José, que colocava pronomes,
Helena, que amava os homens,
Sebastião, que se arruinava,
Artur, que não dizia nada,
embarcam para a eternidade.

O poeta está bêbedo, mas
escuta um apelo na aurora:
Vamos todos dançar
entre o bonde e a árvore?

Entre o bonde e a árvore
dançai, meus irmãos!
Embora sem música
dançai, meus irmãos!
Os filhos estão nascendo
com tamanha espontaneidade.
Como é maravilhoso o amor
(o amor e outros produtos).
Dançai, meus irmãos!
A morte virá depois
como um sacramento.