terça-feira, outubro 18, 2005

Surto de autoquestionamento que não vai mudar o mundo nº186

Deveria estar estudando, mas, como tem sido praxe, não estou conseguindo concentração para me dedicar aos textos teóricos. Meus trabalhos estão atrasados, as minhas leituras também.
O dia está horrível e não acho ânimo. Escrevi uma carta na sexta-feira e ainda não consegui descer até o Correio.
Pensei que ando um tanto mais idealista ultimamente. Pensando em como o mundo seria melhor no caso de as pessoas serem um pouco mais altruístas.
Ando também me sentindo bastante incomodado quanto à organização social do nosso mundo. Uns têm muito, outros nem o que comer, o que sequer me parece justo.
Voltei a pensar mito na questão do darwinismo social, sobre que discorri há um tempo aqui neste blog.
O fato de estar repetindo o tema torna desnecessário atestar que não acho que ninguém possa ser melhor ou pior do que ninguém. Não acredito e, no entanto, é o dinheiro que cria as oportunidades e as comodidades no nosso mundo. Recuso-me a acreditar que quem não dispõe desse facilitador pecuniário da vida seja pior ou melhor do que quem o possui.
Nada de novidade até então, nunca fiz segredo disso.
Entretanto, estive pensando no motivo de eu me importar tanto com isso e creio que cheguei a algum lugar.
Talvez eu possa dizer que na verdade o ser humano é sempre egoísta de algum modo. O egoísmo, ao que parece, é exatamente a lógica de funcionamento da consciência humana em relação à grande máquina da injustiça estabelecida num mundo sem Deus.
Comecemos por dizer que não gosto de pensar no que farei no futuro e isso porque faço faculdade de Letras. Inevitável que achem que serei professor e, de fato, essa é sempre uma grande possibilidade. Ser professor em um país onde não se valoriza a cultura, a carreira acadêmica, a descoberta científica, a construção de bibliotecas ou mesmo a eliminação do analfabetismo (funcional ou não).
Ser professor em um país assim é quase como assinar um atestado ambíguo, misto de burrice e de resignação quanto ao iminente fracasso em termos de ascenção social, coisa de que provavelmente a maioria de nós gostaria.
Sendo assim, torna-se frustrante saber que provavelmente estarei fadado a catar latas enquanto temos tanta gente tão desonesta e cheia de vícios com contas bastante recheadas em paraísos fiscais caribenhos.
Aqui a questão torna-se pontual: será que o motivo dessa organização social perversa e provavelmente imutável me revoltar se relaciona ao fato de eu ser capaz de me comiserar em relação ao meu próximo? Ou será que se trata mais de algo relativo ao meu sentimento de frustração em relação a um fracasso que eu tenho em meus horizontes?
Podemos até abrir um pouco mais o leque.
Alimentamos crianças carentes, enviamos mantimentos ao nordeste, damos lugar às grávidas no ônibus. A troco de quê?
Comiseração? Impulso egoísta de apaziguação da consciência tendo em mente a moral absorvida devido à existência dentro de uma determinada cultura que prega isso? Ou mero receio de um julgamento moral pela sociedade?
Ultimamente, a segunda hipótese tem me parecido mais acurada, ainda que ache que não é ela que rege todas as relações humanas. Nem todas, mas várias, tenho certeza.
E é com essa certeza e um juízo negativo em relação a ela que, cada vez mais, creio que o mundo só terá mesmo salvação se todos virem nisso alguma vantagem pessoal. O interesse provavelmente é o que move o mundo, ainda que ele nem sempre seja pecuniário, como normalmente a palavra interesse nos faz pensar.
Talvez seja uma necessidade de ficar bem com a consciência, com a sociedade, necessidade de prazer em qualquer sentido. Isto é, temos o lado meramente egoísta da consciência e da vida.
Óbvio que não poderia deixar de fazer essas divagações que só me poluem a cabeça e angustiam. Monte de lixo inútil que nunca mudará o mundo. Se esta a sina, aceito com prazer e só pelo prazer, já que me parece mais atraente que estudar tópicos discursivos no momento. Claro, tenho algum interesse nesses textos, como você também deve ter ao ler. Ah, quem-ler, quem-ler... Sempre pensando em si mesmo. Talvez isso seja a única coisa que nos une. Já que não tenho controle de quem acessa aqui, talvez nem de você eu goste. Talvez só goste da sua atenção frente ao que eu produzi, às .minhas idéias. Provavelmente aturarei sua opinião sobre o que eu escrevo, mas, provavelmente, apenas se ela for positiva. Parodiando Manuel Bandeira: sou escritor de idéias ruins, perdoai. Perdoai também o certo pessimismo melancólico. Não há dia nublado de ócio que não me deixe assim.