quinta-feira, janeiro 27, 2005

01:50 am, fome, Kittie e penumbra

(ao som de Kittie - Brackish)

Não, simplesmente não. E é "não" porque simplesmente falta paciência para a dúvida. Às vezes tenho a certeza de que a minha conversão em um tremendo bundão tende a me tornar algo como um ente inatingível e emocionalemente apático, mas não. Talvez apenas tenham mudado as coisas que me atingem e talvez ainda seja tão emocionalmente vulnerável como outrora. Somos vulneráveis e somos de carne e neurônios - sobretudo neurônios. A verdade é que o que tinha de felicidade dentro da lata de sorvete que assaltei hoje se acabou e sobrou a melancolia para me acompanhar durante esse post. Azar o seu, já que eu até gosto de tê-la como companheira porque me inspira a escrever sem muita medida, sem coesão, mandando às favas a colocação pronominal, já que nem domino mais suas regras direito. Melhor do que o impulso à escrita, a melancolia rouba-me as dúvidas, ainda que me fazendo pender para um prisma pessimista. Sim, uma pessoa emocionalmente equilibrada tem dúvidas porque tem capacidade de distinção entre bem e mal (ainda que eu corra do maniqueísmo como o diabo da cruz) potencializada. Já eu, que estou penso para um lado, manco, tendo a acreditar que não vai dar certo. O quê? Não interessa, assunto meu. (Ainda que a omissão desse assunto não torne esse blog menos pessoal... A exposição por aqui é grande, apesar de maquiada). E teve gente que já se meteu nos meus assuntos demais por uma encarnação. Se o tratava com reservas, agora ele merece a frieza, nem que seja até que resolva tomar uma boa dose de chá de semancol. O coice vem mesmo de onde menos se espera.
Voltando à dúvida, já que o universo é um grande ponto de interrogação e já que as interrogações geram as angústias. Angústia é um sentimento de encruzilhada, que não parece levar a nada, um atoleiro. Já a raiva... Tá aí, queria sentir raiva, então. Tornar-me-ia (já que me acham esnobe...) impulsivo o suficiente para acabar ou avivar tudo isso e "tudo isso" nem existe direito ainda porque ainda não compreendo muita coisa e acho que não sou entendido também.
Hora de ir para a cama.

(Paulinhoterapia não é droga, mas em excesso pode cegar a inteligência e a capacidade de distinguir um texto ruim de um bom. Pratique com moderação.)
Lisa, ele não deu a mínima para o seu comment.


Necrológio dos desiludidos do amor

Os desiludidos do amor
estão desfechando tiros no peito.
Do meu quarto ouço a fuzilaria.
As amadas torcem-se de gozo.
Oh quanta matéria para os jornais.

Desiludidos mas fotografados,
escreveram cartas explicativas,
tomaram todas as providências
para o remorso das amadas.
Pum pum pum adeus, enjoada.
Eu vou, tu ficas, mas os veremos
seja no claro céu ou no turvo inferno.

Os médicos estão fazendo a autópsia
dos desiludidos que se mataram.
Que grandes corações eles possuíam.
Vísceras imensas, tripas sentimentais
e um estômago cheio de poesia...

Agora vamos para o cemitério
levar os corpos dos desiludidos
encaixotados completamente
(paixões de primeira e de segunda classe).

Os desiludidos seguem iludidos,
sem coração, sem tripas, sem amor.
Única fortuna, os seus dentes de ouro
não servirão de lastro financeiro
e cobertos de terra perderão o brilho
enquanto as amadas dançarão um samba
bravo, violento, sobre a tumba deles.

(Carlos Drummond de Andrade)

terça-feira, janeiro 18, 2005

Das novidades

Começo por dizer que demorei um pouco na atualização do blog e isso deve-se basicamente a duas coisas: falta de tempo e falta de assunto.

Sim, porque eu escrevo quase que exclusivamente sobre o que me inquieta, isto é, mazelas, comportamentos que me são irritantes, algumas reflexões, etc. A partir disso, dá para deduzir que a vida tem me tratado bem. Não maravilhosamente, mas bem. O perigo de sermos muito bem tratados é que nos tornamos mimados e eu não quero isso. O mimo enfraquece as pessoas, o mal trato enlouquece e há um certo lirismo e relativa sensatez na loucura.

Basicamente, o que acontece é que eu não tenho sido irritado por nada que me levasse a escrever. Acho que estou numa fase intermediária, de enterro de algumas minhocas antigas da minha cabeça e a criação de novas. Porque minhocas são necessárias para impulsionar alguma evolução. E evolução é vida e é futuro: "perspectiva" é a palavra chave. E as minhas parecem boas, apesar da vigência do meu inferno astral (rs). Minhas dúvidas ainda existem, mas tem se dissipado numa velocidade que não me permite esmiuçá-las. Mais do que isso: tudo parece mais fluido, mais dinâmico. Tem coisas mudando.

Com relação à segunda fase da Fuvest, limito-me a dizer que acho que fui bem e que continuo com boas chances de entrar para a FFLCH.
Foram 3 provas: Português, História e Geografia. Português e Geografia pareceram-me bem elaboradas. Já a de História... Gostaria de trancrever o que o Etapa disse sobre a prova de história, que eu julguei razoavelmente escrota:

"História - uma prova exigente, trabalhosa e desproporcional
O equilíbrio que existia na prova de segunda fase da Fuvest no ano passado, quando comprada à presente, foi rompido.
Das vinte peguntas, pelo menos dez podem ser consideradas de alta complexidade. As outras dividem-se eqüitativamente entre questões de complexidade média e básica. Perguntas aparentemente simples, para serem cabalmente respondidas, exigiram verdadeiras dissertações, daí o caráter desproporcional da prova. Observou-se também que possíveis inerpretações históricas foram apresentadas nas perguntas como se fossem questões irretorquíveis, como a questão 2, que afirma a existência de uma "integração" na Europa Medieval. Com muita propabilidade, o tempo (três horas) e o espaço disponíveis para responder cada questão não foram suficientes.
Mesmo o candidato estudioso e bem preparado deve ter experimentado uma grande dificuldade para resolver a prova. Face ao exposto, resta saber se esta prova realizou os propósitos a que se destinou".


Concordo com o Etapa. Não porque sou "puuuuuuxa!" ou por o Antônio ser Deus. Simplesmente já tinha juízo formado sobre a prova e o Etapa achou o mesmo que eu. Já o Anglo, além de ter dado respostinhas de três linhas para cada questão, elogiou a prova. Simplismo é sinal de ignorância e ignorância não é bom e mata. O resultado sai dia 10 de fevereiro.
(Nossa, que texto interessantíssimo... Desculpem, mas estou ocupado fazendo coisas importantes, como comendo chocottone louca e vorazmente.)

COmo faz muito tempo que não coloco nenhuma música ou poesia aqui, decidi colocar uma que a Marina Lima fez em parceria com o Arnaldo Antunes. Isso porque a vida às vezes parece muito grávida e também porque a letra da música é muito inusitada, divertida... E estranha.


Grávida

Eu tô grávida
Grávida de um beija-flor
Grávida de terra
De um liquidificador
E vou parir
Um terremoto, uma bomba, uma cor
Uma locomotiva a vapor
Um corredor

Eu tô grávida
Esperando um avião
Cada vez mais grávida
Estou grávida de chão
E vou parir
Sobre a cidade
Quando a noite contrair
E quando o sol dilatar
Dar à luz

Eu tô grávida
De uma nota musical
De um automóvel
De uma árvore de Natal
E vou parir
Uma montanha, um cordão umbilical, um anticoncepcional
Um cartão postal

Eu tô grávida
Esperando um furacão, um fio de cabelo, uma bolha de sabão
E vou parir
Sobre a cidade
Quando a noite contrair
E quando o sol dilatar
Vou dar a luz

sexta-feira, janeiro 07, 2005

Questionamento compulsivo somado à melancolia emprestada de Eugênio, de Olhai os lírios do campo

Por que escrevo? Unicamente para matar o tempo e matar quem me mata, uma vez que cabeça vazia é a oficina do diabo. E tem sido. Trata-se do meu quarto dia de férias efetivamente falando e eu já me encontro irritado. Irritado pelos pensamentos e pelo ócio. O ócio... Não consigo faze-lo criativo de modo satisfatório. Na verdade, aproveita-lo para criar ou exercitar algo exige o mínimo de força de vontade e de falta de preguiça e eu não disponho de nenhum deles. Apenas vegeto. Aliás, se vegetasse não poderia dar-me ao luxo de ficar questionando compulsivamente os mais diversos aspectos da minha vida. São, sobretudo, aspectos razoavelmente obscuros e que são pedras no meu caminho. Aliás, nem pedras são. São gavetas fechadas e eu não disponho das chaves para revelar os conteúdos. Dúvidas das mais diversas.
Ando com meu humor em uma montanha-russa e com a gula em alta. Começo a acreditar na baboseira de inferno astral.... Ao inferno os astrólogos! Aliás, a vontade mesmo é de mandar muita gente para o inferno. Bem poucos se salvariam hoje e isso é porque ando mais sensível e intolerante em relação aos defeitos alheios e às pisadas de bola. Desde ontem tenho me questionado muito a respeito dos amigos de conveniência, da volubilidade das pessoas e à minha incredulidade mediante as suas declarações de amizade e carinho. Sinceramente, prefiro que provem tudo isso com atos ao invés de simples abraços que me roubam o jogo de cintura e até me entorpecem o sarcasmo. (ainda que não negue que os abraços são muito lisonjeiros). Quero colo. Preciso dele. Eu percebo isso mas há quem insista em não perceber. Faço todo o possível para dar suporte àqueles que sabem que me são caros, mas, infelizmente, ontem tive a impressão de que a satisfação pessoal parece ser muito mais importante do que eu e que, enfim, não há reciprocidade. Afinal, o que eu posso proporcionar a alguém? Ontem, nem risadas. Só meia dúzia de frases soltas, carregadas de um pessimismo e uma lerdeza aflitiva. Pensamentos que se embaralhavam e não expressavam pelo que eu passava. Talvez tenha sido bom. Não creio que a indiferença que me foi mostrada possa ser indício de tratar-se de alguém realmente confiável. Logo eu! Confiar em alguém que não merece essa confiança... Realmente, preciso de um pouco mais de amor próprio, reflexão e, definitivamente, colocar em ordem alguns aspectos da minha vida. Reavaliar, pesar novamente algumas relações e ver se realmente são pessoas que possam ser tão confiáveis quanto eu necessito e tão generosos como uma amizade de verdade requer. Porque a amizade pressupõe altruísmo e porque eu tenho asco do egoísmo.
O egoísmo leva a outra questão que me incomoda porque convivo com ela: individualismo. E ele está aqui, no quarto ao lado, dormindo. Está exausta (no feminino por trata-se de mera encarnação do individualismo e do desapego). Enquanto isso, eu tenho tempo de pensar em como nossas relações estão sendo corroídas ao longo do tempo e conforme a vida moderna passa a demandar cada vez mais de nós. Em verdade, somos escravos dos nossos horários, compromissos, trabalho e simplesmente falta tempo para todo o resto. Minha casa parece ter se convertido em uma pensão e chego a sentir saudoso qunato a um passado não muito distante. É um saudosismo de tolos. Ao analisar profundamente, dá para ver que o passado e tão desesperador quanto o sono tranqüilo do individualismo, que dorme aqui ao lado. Dorme pesado, como que concentrada, até o sempre. Enxergar isso é convite ao ceticismo, no qual eu não consigo ver felicidade ou beleza. A mim os céticos soam muito áridos, como aquele desenho odioso, o “U.S. Marshalls”. Confesso que a visão apocalíptica do desenho me causava um desconforto estranho, o que talvez se deva ao fato de irreal demais de um modo pessimista aliado à morte das perspectivas humanas. Talvez o ceticismo se assemelhe muito à morte da esperança e deve ser este o motivo que me leva a relutar em aceita-lo de uma vez por todas como uma verdade minha, ainda que por muitas vezes me seja bem claro que trata-se da verdade do mundo.
De fato, como vem acontecendo desde ontem e ao longo de todas as conversas nas quais eu tento ser simpático, minhas idéias estão muito desconexas e só me desculpo com quem vai tentar entende-las. Um calor infernal e eu aqui com calafrios. Definitivamente, preciso ocupar a minha cabeça com alguma coisa que não me tragam mais questões.
Talvez a ansiedade pela segunda fase da Fuvest esteja colaborando com esse sentimento estranho que eu sinto. Fuvest... Fuvest... Fuvest... Chega.